A PROPÓSITO DO ESCÂNDALO DAS QUEIMADAS NA AMAZÔNIA



                                                                       ( Artigo de Raimundo Nogueira )

Na Amazônia, a limpeza e preparação do solo para o plantio, principalmente nas pequenas propriedades – sem os recursos da mecanização -, ainda são realizadas através de queimadas, uma prática que remonta aos primeiros habitantes humanos deste imenso “inferno verde”, hoje chamuscado pelo fogo.

Ao longo do processo de ocupação da Amazônia, sobretudo no século passado, as queimadas foram ganhando novos usos, como na renovação de pastos para o gado, e novas dimensões, especialmente pelo aumento da população e pelo avanço da fronteira agropecuária sobre à região.

A necessária defesa da floresta amazônica, ao contrário do que alguns dizem, não é incompatível com a exploração econômica de seus recursos naturais. O zoneamento ecológico-econômico da região, se já tivesse sido implementado em todas as etapas e em todos os níveis da Federação – União, Estados e Municípios -, indicaria a vocação econômica das macro e microrregiões, delimitando os espaços nos quais a exploração dos recursos naturais se revelasse compatível com a sustentabilidade do meio ambiente.

Nas áreas de campos naturais, como os que ocorrem no sul do Amazonas e centro-oriental de Roraima, a pecuária, por exemplo, poderia ser explorada em larga escala, sem prejuízo ambiental significativo. A agricultura nas várzeas de nossos rios, principalmente do rio Amazonas, também poderia ser explorada, com altas taxas de produtividade e com baixo ou nenhum custo ambiental. Nas várzeas amazônicas, a agricultura não exige desmatamento nem o emprego de fogo para limpeza da área de plantio, além de dispensar adubo químico, pois o ciclo das águas se encarregam de fertilizar o solo pelo depósito periódico de húmus.

A exploração agropecuária em áreas de “terra firme” não apenas impõe um alto custo ambiental, mas também um pesado passivo econômico. A pecuária e a agricultura, nesses espaços, requer desmatamento, queimadas e correção do solo, que registra alto teor de acidez e acentuada pobreza de nutrientes.

Por outro lado, a piscicultura encontra na Amazônia um dos ambientes mais propícios para o seu pleno desenvolvimento. A abundância de água, a diversidade de espécimes, os incontáveis “braços” de rios, lagos, paranás e igarapés (que dispensam grandes obras de engenharia para o confinamento) são fatores que favorecem a exploração econômica de nossos recursos piscosos.

A biodiversidade que reside na floresta e na bacia hidrográfica constitui um fabuloso mundo a ser decifrado e transformado em riqueza econômica pela ciência brasileira. A floresta desafia nossa criatividade – que se manifesta extraordinariamente no carnaval, no boi e na ciranda – a criar novos modelos de ocupação urbana, com cidades inteligentes, seguras, confortáveis e completamente integradas à cobertura vegetal da região.

Nenhum recurso natural explorável economicamente - na Amazônia ou em qualquer outro bioma do planeta - dever ser negligenciado, mas sua exploração deve ser feita em prol da dignidade da vida e NÃO da (i)lógica do capital, que a tudo reduz à simples mercadoria. Uma nova invenção da Amazônia, agora fundada na dignidade da vida e no respeito à natureza, levada a cabo pela invencível criatividade do povo brasileiro e amazônida, seria o surgimento da mais refinada civilização que o mundo já conheceu.

 Raimundo Nigueira é dvogado, cientista político, escritor e professor.

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