Bolsonaro e a Fábula do Lobo e do Cordeiro



POLÍTICA
BOLSONARO E A FÁBULA D’O LOBO E O CORDEIRO
( Por:  Raimundo Nogueira )


A repercussão internacional do aumento das queimadas na Amazônia brasileira levou o presidente Jair Bolsonaro, cujo governo promove o desmonte das políticas ambientais implementadas nos últimos trinta anos, a acusar às ONGs de estarem por traz das incinerações florestais, este ano.
O comportamento presidencial me fez lembrar da fábula d’O lobo e o cordeiro, de Esopo, na versão de Monteiro Lobato. Eis a fábula, com adaptações de minha responsabilidade:
Estava o cordeiro a beber num riacho que descia da montanha, quando apareceu, na parte superior, um lobo esfaimado, querendo devorá-lo.
— Que desaforo é esse de toldar a água que vim beber? — disse o lobo arreganhando os dentes.
O cordeirinho, trêmulo de medo, respondeu com inocência:
— Como posso turvar a água que o senhor vai beber se ela corre do senhor para mim?
Era verdade aquilo e o lobo atrapalhou-se com a resposta. Mas não desistiu de seu mau intento.
— Além disso — inventou ele — sei que você andou falando mal de mim o ano passado.
— Como poderia falar mal do senhor o ano passado, se nasci este ano?
Novamente confundido pela voz da razão, o lobo insistiu:
— Se não foi você, foi seu irmão mais velho, o que dá no mesmo.
— Como poderia ser meu irmão mais velho, se sou filho único? – respondeu o cordeiro.
O lobo, furioso e vendo que não tinha como justificar sua intenção de devorar o cordeirinho, veio com esse argumento de quem não tem razão:
— Pois se não foi seu irmão, foi seu pai ou seu avô!
E — nhoc! — sangrou-o no pescoço.
A exemplo do lobo, furioso e sem explicações para o aumento das queimadas – exceto as medidas de seu próprio governo, como o relaxamento da fiscalização e da repressão aos crimes ambientais, o que estimulou os infratores -, o presidente, apoiando-se numa insustentável teoria da conspiração, acusa as ONGs ambientais – vejam só - de promoverem a incineração da floresta para sabotá-lo perante a opinião pública doméstica e internacional.
Em outras palavras, o presidente, “tolda a água do riacho” e culpa exatamente as organizações e ativistas que historicamente se construíram na luta em defesa do meio ambiente. A moral da narrativo do “mito”, assim como na fábula, é a mesma: o tirano sempre encontrará pretexto para sua tirania.
Raimundo Nogueira, advogado e professor, escreve aos sábados para o Portal do Ozy

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